sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Armas químicas e poemas





Olhos fechados, mistura de aromas e cores
Sensações desencontradas atraindo-se de modo muito singular.
Pluraridade de encaixes, perfeitamente ajustados à cada detalhe.
Conversas paralelas, pensamentos convergentes...
Transbordando de planos e hormônios próprios da idade.
Sem expectativas. Não foi feito pra dar certo.
Tanta sintonia. Ela lê no acaso o que ele vive de perto.
Sensibilidade para enxergar as coisas simples da vida
Encontro de almas (inclusive)
É uma arma de destruição em massa o amor
Mas ele lembrou: Não foi feito pra dar certo
E ela se calou. Decidiu sorrir pro seu futuro incerto.



quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Os ursos, as estrelas e o mistério da pluraridade do ser





Olhou para o céu e para o relógio. Fechou os olhos e respirou fundo aquele ar de quase noite. Lembrou de uma música que dizia qualquer coisa como "você às seis e trinta..." Sorriu. A lua já aparecia no céu.. Mas cadê as estrelas? Era delas que estava à procura hoje.
Era ainda uma menina sem muita experiência mas gostava muito de pensar nas coisas, principalmente nas sem sentido. Sempre achou graça daquelas pessoas que batiam no peito dizendo ter personalidade ou opinião formada pra tudo. Não sabia como conviver com elas. A única coisa que batia em seu peito não dependia da sua vontade, e ela nunca tinha certeza de nada...
Pensou nos ursos polares que precisam se confundir com a neve para sobreviver e para isso tentam a qualquer custo camuflar os seus fucinhos negros... O homem também é assim. Como pode dizer que tem uma personalidade?
Não, não é aquilo de "tentar sempre se encaixar nos padrões", é coisa de dentro mesmo, de essência. Não mostramos o que somos porque realmente não o sabemos.
Talvez pela mudança que é constante e de lei... Pelas RPM (ou revoluções por minuto) mas somos apenas uma imagem imperfeita de nós mesmos.
 Nos mostramos através de rótulos e nos comportamos de diferentes maneiras quando submetidos a um meio: na família somos filhos, na escola alunos, com os amigos o palhaço, o sério, o antipático... Representamo-nos o tempo inteiro e nem sabemos ao certo o que isso significa, ou onde isso vai nos levar.
"E como confiar em alguém se não sei nem quem eu sou?"
Levantou uma das sobrancelhas. As vezes se odiava por pensar tanto.
Suspirou. Prezava muito valores como sinceridade, transparência e desejou do fundo da alma entender esse mistério.
Ficou ainda alguns segundos com os olhos fechados, refletindo... Mas terminou por se convencer isso que isso tudo não era falta de transparência ou sinceridade
Os papéis que representamos são todos partes de nós, somos vários e somos tudo o tempo todo. Somos resquísios de nós mesmos em metamorfose ambulante, como dizia Raul.
Se não conseguimos fazer explodir pra fora dos contornos do nosso ser a nossa verdadeira essência, se somos metade realidade e metade ilusão de ótica, isso não é um mal (ou bem) exclusivo do bicho-homem. Lembrou-se então dos ursos polares...
Abriu os olhos e contemplou de novo o céu. Dessa vez conseguiu enxergar as estrelas...
"Até o céu se mostra sob um véu de ilusão: umas estrelas estão tão longe que, quando chega a luz aqui, elas já nem existem."
E sorriu de novo. É, nem o céu é completamente verdadeiro.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Arriscar

Não apenas uma vez tentei em vão cessar uma dúvida:
O que diferencia uma escolha certa de uma escolha errada? E ainda, qual o parâmetro para tal julgamento?

Talvez o ideal fosse que tivéssemos várias vidas, como no vídeo game... Aliás, acho que só duas tava bom. Daí a primeira seria um espécie de teste e na segunda, quando porventura insistíssemos em tomar as mesmas decisões que não deram muito certo na vida anterior, um alarme ensurdecedor tocaria no nosso ouvido, fazendo com que as ondas se propagassem por todo o corpo anestesiando-nos e impedindo-nos de continuar no erro.

Ou então, quem sabe o ideal mesmo fosse que cada dúvida de nossa vida se materializasse em duas estradas paralelas e que levassem a caminhos antagônicos, e que toda vez em que nos encontrássemos diante delas o nosso corpo se dividisse também em dois e que cada um pudesse seguir por um dos caminhos.
Assim, ultrapassando este momento de dúvida, quando a estrada finalmente se convergisse novamente em uma só, os dois corpos se encontrariam e decidiriam qual o caminho, qual a decisão foi a correta.
Seria perfeito não?

Não, não seria. Não só pelos absurdos dessas metáforas... Mas já pensaram se os corpos ao fim da “estrada da dúvida” não quisessem voltar a ser um só? E se eles quisessem, digamos assim, declarar sua independência? É, isso também parece absurdo.

No entanto, não pareceria (tão) absurdo se ao passarem por essa dupla estrada e chegassem ao momento de julgar suas experiências, cada um dos corpos decidisse que a sua foi a mais correta, a mais benéfica, a melhor escolha... Ou que os dois achassem que sua experiência foi a pior, a mais dolorosa e quisessem refazer o percurso, sendo que cada uma na estrada oposta...







E é aí que voltamos ao ponto de partida: qual o parâmetro para julgar uma escolha?

Milan Kundera escreveu extraordinariamente sobre isso em sua obra “A insustentável leveza do ser” no trecho que diz:

“ (...) Torturava-se com recriminações, mas terminou por se persuadir de que no fundo era normal que não soubesse o que queria:
Nunca se pode saber o que se deve querer, pois só se tem uma vida e não se pode nem compará-la com as vidas anteriores nem corrigi-la nas vidas posteriores. (...)
Não existe meio de verificar qual a decisão acertada pois não existe termo de comparação. Tudo é vivido pela primeira vez e sem comparação. Como se um ator entrasse em cena sem nunca ter ensaiado (...) einmal ist keinmal, uma vez não conta, uma vez é nunca. Poder viver uma vida é como não viver nunca.”

Diante desse pensamento e de convicções que tinha mesmo antes de ler sobre isso, defendo que a palavra escolha não pode ser suscetível de adjetivações ou divisões oscilantes de certo e errado.
Não acredito na existência de escolhas certas ou erradas, mas sim do caminho que você decide percorrer e as conseqüências que isso vai gerar para você e para tudo que está a sua volta. É a tal da Lei da Causa e Efeito.
Mas viver uma vez não é viver nunca. Disso peço licença a Kundera para discordar...

Penso que viver uma vez é ter a chance de tentar fazer, na medida de nossas limitações particulares, sempre o melhor que se pode. Se tivéssemos realmente a certeza de que vivemos uma outra vida e a consciência de tudo o que passamos nela, haveriam tantas lembranças e experiências gravadas na nossa mente que nos seria negado um dos maiores prazeres de nossa breve existência, que é poder de arriscar.





Há quem discorde, mas arriscar é necessário. Mergulhar no abismo do desconhecido tem sim seus riscos (e admito que são muitos) mas esse perigo também traz emoção, liberdade, e por que não, realização?
A magia que existe no desconhecido só é camuflada por causa da hipótese do erro, que possui por essência uma beleza que pode ser comparada à de uma pedra preciosa, daquelas que precisam ser lapidadas, mas que com paciência e percepção pode ser enxergada. E como eu já disse que aqui, acredito que o erro é meramente uma ilusão de ótica. Temos que ter em mente que as vezes um caminho tortuoso pode levar ao mais perfeito paraíso.

E olha, pra mim é esse o grande motivo pra que mesmo que tenhamos vivido mil vidas, e ainda que possamos viver mais mil, isso é retirado de nossa memória: para que sempre pensemos que estamos vivendo a primeira e única vida; para que não percamos a capacidade arriscar; para que possamos aprender não apenas através dos clichês dos “erros e acertos”, mas sim através de nossa sensibilidade; para que percebamos que o mais importante não é o caminho que se percorre, mas o porquê se percorre; para que continuemos mergulhando pela esperança de decifrar o desconhecido.. ou talvez apenas pelo prazer de mergulhar!





“ Um século, três,
se as vidas atrás
são parte de nós.

E como será? "




quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Sinestesia

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Sinto um aroma que há muito não sentia...
São lembranças desenrolando-se em fios infinitos, que se entrelaçam para alcançar os restos da luz minguante da lua que aos poucos se esvai, abrindo-se em um novo amanhecer...
Desta vez são os fios do Sol que se desenrolam no ar, como um quadro inacabável de cores inimaginadas, anunciando a imortal esperança que teima em voar por entre as flores do jardim de minha alma.

Sinto um calor que á muito não sentia...
São lembranças irrelevantes nascidas pura e simplesmente da tranqüilidade que a ilusão do amor me traz...
Por um minuto posso esquecer que o ardor que me desnorteia já não cabe mais no lado esquerdo, e que o silêncio que queima não aquece nenhum lugar.

Sinto cores que há muito não sentia...
São lembranças do amanhã que a fragilidade do instinto atrai... São borboletas a desviar um suave caminho para qualquer estrada que leva ao mar...
Olho seus velhos sinais no que deslizam por entre meus dedos e que se confundem com a claridade das asas que brotam bem do meio de sua coluna vertebral.

Sinto um pesar que há muito não sentia...
São lembranças de poucos dias percorridos ou daquelas vidas passadas que a memória se encarregou de arrancar de mim...
O toque que se metamorfoseia em imensuráveis sensações, que desencadeiam uma alegria insana e desmedida com sabor de deja vú.

Sinto o aroma, o calor, as cores e um profundo pesar...
Quem sou? Quantas fui? Com quem estarei?
São apenas as mais ínfimas partículas de dúvida e outros medos, ou quem sabe as mais puras angústias metafísicas...

E assim os destinos seguem...
Diametralmente opostos, Longe, e do mesmo lado... De modo que não se aproximam e nem se afastam mais, vivendo assim uma espécie de eterno início...
Uma linda e surreal sinestesia que contraria qualquer lógica. Um perfeito paradoxo que se vê coexistindo não apesar de suas diferenças, mas principalmente por cauda delas.
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